segunda-feira, 18 de julho de 2011

Inquérito Literário [Parte 3]

Continuação da entrevista concedida por Carlos Câmara ao jornal O Nordeste em 1923.
Inquérito Literário [Parte 1]
Inquérito Literário [Parte 2]

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De suas peças qual a que prefere?


CARLOS CÂMARA – Dolorosa interrogação... Não lhe posso dizer, ao certo, qual de minha peças prefiro. Dediquei a todas elas o mesmo esforço mental, e mesmo um pai não deve revelar a qual de suas filhas dá a preferência.

Luta com dificuldades para fazer interpretar pelos amadores do Grêmio Dramático os diversos papéis?

CC – Pouca ou nenhuma dificuldade tenho encontrado para fazer interpretar as minhas peças pelos inteligentes amadores que constituem o elenco do “Grêmio”, em sua maioria rapazes e moças de reconhecida propensão para a arte teatral. Além disso, procuro, meu caro, na distribuição dos papéis, aliar as personagens ao gênero e tendência de cada um.

Seus trabalhos teatrais são escritos aos poucos, vagarosamente? Quais as horas que prefere para trabalhar? Em que lugar? Quando escreve, auxilia-se de notas diárias, rabiscadas antes? Para imaginar as peças, serve-se de alguém para ensaios?


CC – São muitas perguntas a um tempo. Vamos por partes. Habituei-me desde que trabalhei na imprensa, a escrever sempre de afogadilho, assim só escrevo para o teatro às pressas e quando o “Grêmio” tem absoluta necessidade de encenar uma nova peça. Quase sempre, antes de concluí-la, inicio os ensaios da parte já escrita. Não tenho preferência de horas, nem de lugar, para rabiscar os meus trabalhos, dedicando-lhe as minhas poucas horas disponíveis e servindo-me para isso de apontamentos colhidos au jour le jour. Na idealização de determinadas cenas, faz-se mister muitas vezes experimentar-lhe o efeito, pondo a prova, ao mesmo, passo, a capacidade das pessoas destinadas a sua interpretação.

Ainda pretende continuar a escrever para teatro? De todas as modalidades de criação qual a que prefere?

CC – Nunca tive veleidades literárias. Escrevi “A Bailarina”, a minha peça de estréia em 1919, despreocupadamente, sem prever o êxito que ela realmente obteve. A criação  foi meramente fortuita. Fi-la a pedido de rapazes do “Grêmio”, em oito dias apenas, no auge da precipitação, e quando ainda convalescia da terrível epidemia*. Enquanto o “Grêmio” existir e tiver necessidade de novas peças, e não aparecer alguém que me substitua neste árduo mister, eu as irei rabiscando. Assim Deus me dê vida e saúde... o gênero de minha [preferência] é a alta comédia; mas esta, por mais bem arquitetada que seja, não logrará tão, infelizemente, em parte alguma do Brasil,  o elevado número de representações que as peças do gênero ligeiro hão conseguido. Não tentei até hoje esse gênero pelas razões acima expostas, e mesmo por não me julgar com as aptidões necessárias para tão altas cavalerias. Ademais, tenho para mim que os esforços que porventura envidasse e o desperdício que fizesse com a montagem de uma peça do gênero diferente, não alcançariam a devida compensação. Isso não deve ser tomado como ambição de conquistar glórias barata, e sim o desejo de proporcionar diversão ao alcance  de todas as inteligências e ao sabo do respeitável público.

Que acha do movimento teatral no Brasil? Teremos, em breve, um teatro verdadeiramente nacional?

CC – Como otimista que sou, julgo, deveras promissor o movimento teatral no Brasil, que se enfronha para ter o seu teatro, verdadeiramente nacional. Quem poderá, porém, prefixar a época em que se veja transformada em realidade tão fagueira aspiração?

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